EDITORIAL
Acta Portuguesa de Nutrição 2024, 39, 02 , https://dx.doi.org/10.21011/apn.2024.3901
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Resumo
NOVAS MOLÉCULAS, VELHOS DESAFIOS
De entre as patologias que se encontram mais estreitamente ligadas aos hábitos alimentares de cada um, a obesidade continua a ter uma preponderância enorme na sociedade atual. Poucas são as sociedades ou grupos de indivíduos que escapam a prevalências demasiado elevadas desta condição, que sabemos estar intimamente relacionada com o risco de desenvolver outras condições clínicas como a diabetes mellitus tipo 2, a hipertensão arterial, as dislipidemias ou algumas formas de cancro, para nomear apenas algumas. O seu tratamento tem constituído um dos grandes desafios da Medicina atual, e as já referidas prevalências inaceitavelmente elevadas são o testemunho não só da nossa incapacidade de a prevenir como de a tratar. A tentativa de encontrar uma solução farmacológica para o problema não é de hoje, estando descritos na literatura ensaios clínicos com variadíssimos compostos desde pelo menos a década de 50 do séc. XX. Esse percurso foi no geral assaz frustrante, fazendo aparecer compostos que ou eram muito pouco eficazes ou, quando revelavam alguma capacidade de reduzir o peso, manifestavam um conjunto de efeitos secundários que impossibilitavam o seu uso racional.
Foi há cerca de 20 anos que surgiram no mercado os primeiros medicamentos da família dos agonistas dos recetores do glucagon-like peptide 1 (GLP1), que sendo inicialmente desenvolvidos para a diabetes mellitus tipo 2, acabaram por demonstrar uma eficácia na redução de peso desconhecida até então. A “corrida ao ouro” por parte das empresas farmacêuticas começou então, fazendo surgir no mercado outros fármacos da mesma família ainda mais eficazes, sobretudo de há cerca de cinco anos para cá. Foram entretanto aprimorados certos aspetos farmacológicos, com algumas novas moléculas a revelarem capacidade de estimular outros recetores como o do glucose-dependent insulinotropic polypeptide (GIP) ou o da glicagina, conferindo-lhes ainda maior eficácia. Podemos encontrar a descrição dos efeitos desta nova classe de medicamentos no artigo de Silva e colaboradores, que é publicado nesta edição da Acta Portuguesa de Nutrição.
Os desafios que o aparecimento destes compostos coloca são múltiplos e envolvem, necessariamente, todos os que se dedicam ao tratamento nutricional e alimentar destes doentes. Dado o ainda reduzido tempo que estes medicamentos têm no mercado, existe ainda algum desconhecimento sobre a melhor forma de atuar sob o ponto de vista nutricional, o que, na visão do investigador, propicia um conjunto muito interessante de oportunidades de investigação.
O peso da obesidade na nossa sociedade é muito elevado: o aparecimento de novas soluções, por muito interessantes que sejam, não deve, no entanto, desviar-nos da importância da prevenção como base da mitigação deste fenómeno e do papel central da alimentação.