EDITORIAL
Acta Portuguesa de Nutrição 2025, 40, 02 , https://dx.doi.org/10.21011/apn.2025.4001
Visualizações: 214 | Downloads PDF: 23
Resumo
Uma Ciência, muitas geografias.
Na última edição da Acta Portuguesa de Nutrição, a edição n.º 39, dedicámos as palavras deste espaço à problemática da obesidade, mais concretamente ao papel da intervenção farmacológica e dos novos desenvolvimentos nesta área e do papel da intervenção alimentar e nutricional neste contexto em permanente mudança. Mas as ciências da nutrição são, efetivamente, uma área de enorme abrangência, como nos demonstra o artigo publicado nesta edição por Viana e colaboradores, dedicado ao estudo da situação alimentar e nutricional na infância no sul de Angola. Os dados apresentados nesta revisão narrativa são esclarecedores: prevalências de desnutrição crónica global, um critério definido pela Organização Mundial de Saúde que classifica como desnutridas as crianças com uma relação da estatura para a idade igual ou inferior ao z score de -2, a rondar os 40% nestas regiões. Do mesmo modo, a presença de baixo peso global (relação do peso para a estatura abaixo do z score de -2) atinge entre 20% a 30% das crianças, consoante as regiões consideradas. Realçamos que estes dados se tornam ainda mais preocupantes dado que a situação descrita pode afetar de forma permanente a saúde de muitas crianças e dos futuros adultos. Pelo contrário, e novamente em clara oposição com a realidade Portuguesa, o excesso de peso não afeta mais de 1% do total desta população infantil.
O contraste é evidente e muito anos de esforços de tantas organizações e de tantos técnicos competentes e empenhados não foram ainda capazes de mitigar as assimetrias gritantes que ainda hoje podemos testemunhar no acesso a uma alimentação adequada e saudável.
Acreditamos que, tal como para os supracitados problemas que afetam sobretudo a população dos países mais desenvolvidos, como a obesidade, as doenças metabólicas ou muitos tipos de cancro, por exemplo, também no contexto de um panorama alimentar com prevalências altas de insegurança alimentar e desnutrição a solução passará por medidas de natureza política e social, necessariamente adaptadas aos contextos locais. Mas estas medidas a adotar só farão sentido se apoiadas na melhor evidência científica disponível, sob pena de, em caso contrário, se revelarem ineficazes ou até contraproducentes. Esta ciência que apoia este tipo de medidas passa, não raras vezes, pelo simples conhecimento rigoroso das realidades de cada comunidade e, nesse aspeto, o artigo de Viana e colaboradores constitui certamente um marco importante para a mitigação dos problemas identificados na região.
Nunca abdicando do rigor que esta tarefa exige, a Acta Portuguesa de Nutrição continuará a publicar artigos que permitam às autoridades competentes estabelecer programas destinados à melhoria do estado de saúde das populações através do seu mais poderoso determinante, o da alimentação e da nutrição.